sábado, 30 de março de 2013

O Fim do futebol arte


Hoje o post será sobre seleção brasileira. Mas, é claro, não irei escrever sobre os últimos dois amistosos. Até porque esse assunto já pereceu. A discussão é outra e, por mais que seja antiga, ainda rende um bom debate, sem prazo de validade.

Logo após o amistoso entre Brasil e Rússia passei um bom tempo resenhando com um amigo sobre a partida. Começamos falando sobre a medíocre atuação da seleção e acabamos numa complexa discussão sobre o futebol espetáculo x futebol resultado. Enfim, divergimos na questão arte. Enquanto o meu amigo se indignava com o fraco desempenho da seleção, relembrava os áureos tempos em que nos orgulhávamos de levar aos quatro cantos um futebol de improviso e descontraído, e vislumbrava o retorno da arte que nos consagrou como a pátria das chuteiras, eu era incisiva em dizer que o futebol brasileiro, como arte, não existe mais.

Ele insistia em me fazer acreditar que o futebol do Brasil apenas passa por uma crise, e que continuamos sendo, irremediavelmente, um celeiro de craques. Fui obrigada a concordar que temos bons jogadores, mas não o suficiente para restabelecer a ordem, e devolver o respeito perdido pela seleção canarinho.

Não tenho a intenção de ser cética. Contudo, se nas décadas de 1960, 70 e 80 tínhamos Pelé, Garrincha, Nilton Santos, Zico, Falcão e Sócrates, craques construídos naturalmente, pura e simplesmente pela habilidade com a bola nos pés, hoje, depositamos toda a nossa quimera em Neymar. Que me desculpe os fãs desmedidos do futebol do rapaz, porém, me parece muito mais um craque midiático do que um jogador brilhante por natureza.

O futebol arte do Brasil se escondeu em alguma vala inacessível e permanecerá no buraco, ao menos que alguma reviravolta convença os brasileiros de que as “construções nacionais” podem ser melhores que as do vizinho. Caso contrário, o nosso futebol se aproximará, cada vez mais, do estilo de futebol europeu. Um processo que se iniciou, de maneira mais contundente, após a derrota na Copa de 82, parece atingir seu auge, 30 anos mais tarde.  O futebol de improviso caiu diante do futebol-força, e a nossa seleção precisou se adaptar ao letal “ocupar de espaços”.

Além disso, os grandes jogadores não aparecem mais com frequência e destreza. Certa vez um professor perguntou aos alunos, no qual eu me incluo, por quantos campos de futebol passávamos nas nossas andanças diárias. Nenhum. Uma resposta unânime. Parei para pensar sobre o assunto, e percebi que há relação direta entre o fim desses espaços de lazer nas cidades e a carência de craques. Até mesmo o crescimento do mercado imobiliário contribui para o fim do futebol arte. Sendo assim, me convenço, ainda mais, que o futebol brasileiro passa por uma mudança gradual e definitiva.

Eram nesses campos de futebol, que antes estavam por toda parte, que os garotos lapidavam suas habilidades e se importavam, exclusivamente, em aplicar o melhor drible e ser elogiado pela jogada. Eram desses campos de futebol, seja na grama cheia de falhas ou no chão batido, que nascia o futebol-moleque, de pés descalços e uniformes enlameados.

Entretanto, esses campos cederam lugar a grandes construções, e o garoto ficou órfão da pelada com os amigos e do status de craque do bairro. Agora, esses meninos de futebol alegre, de jogadas espontâneas, e talento incontestável foram substituídos pelos craques-robôs. O “bom jogador” fabricado nas escolinhas de futebol, com treinamento delimitado, cones marcando os espaços, e o sonho de ganhar milhões em um grande clube europeu.